A COR DO SONHO

Era muito cedo, noite ainda.
 Ele estranhou o silêncio que nascia por entre o arvoredo denso , como se fosse uma sombra acompanhada de múltiplos ruídos. A bruma , cercava-o de um branco translúcido, imaterial, quase luminoso, tantas as gotículas suspensas e húmidas, reflectindo o brilho das últimas estrelas que se esforçavam a atravessa-la com luz . Enquanto metia as mão nos bolsos , e os ombros se vergavam para diante aconchegando a nuca ao calor do casaco grosso que o cobria abaixo dos joelhos, os olhos procuravam no ar denso de cristais , um qualquer sinal. Não era a primeira vez . Há muito que sentia tentado a penetrar no seu interior ,desvendar-lhe o núcleo misterioso, como se a dança que se desdobrava em formas abstractas , e se dissipava no ar em farrapos , o seduzisse como um abismo. Via-a naquele traje transparente, sedutor, enigmático no seu silencioso esvoaçar . Sentia-a como um levíssimo peso denso sobre os seus ombros. Sentia-lhe o respirar, o aveludado da pele, o algodonado pairar, o odor húmido dos lábios. e os olhos negros molhados de água , encerravam-se por detrás de pálpebras semi-fechadas de agua . Ele, avançava cautelosamente sobre solo traiçoeiro que o escuro encobria, estendendo os braços carentes à imaginação do sonho que deambulava esquivo, na asas da aragem. Tocou-lhe os cabelos líquidos, o corpo esvoaçante que se desfazia e refazia em movimentos ondulantes deslizantes, formas caleidoscópicas intermináveis sob os sentidos do olhar. Sorriu languidamente húmida, aos primeiros raios de sol e esquivou-se por entre as folhas que projectavam no solo pequenas sombras trémulas. O pulsar do coração pairou por algum tempo ainda sobre as copas das arvores , para se dissipar por completo ao canto matinal de uma ave .
 ( De mim....)

Coisas de NOVEMBRO

   A MULHER DAS CASTANHAS







Envolta na neblina matinal vinda do mar, já a mulher das castanhas apregoa : - Quentinhas !
Está ali, naquela esquina do tempo, que dobro desde sempre, desta vez a uma hora bem diferente num dia também diferente.     De olhos postos nas nuvens de fumo que se elevam dos tachos e rodopiam no ar, ela, a mulher de cabelo apanhado num carrapito desgrenhado, mexe e remexe com as mãos ásperas , dedos enegrecidos e unhas roídas, as castanhas quentes nos assadores assentes na velha carripana, tão velha , que meia empenada tomba para um dos lados, mais parecendo cair que manter-se de pé.    E lá vai apregoando, enquanto me perco nas nuvens de fumo revoltas e densas como aquele nevoeiro em que adormeci de cansaço nos braços do cansaço da noite.    Por entre as nuvens dou comigo a caminhar sobre os vincos e as rugas da cidade, os vestígios que sobram dos lençois esquecidos, desfeitos num qualquer quarto vazio onde a respiração lhes deixou o aroma da noite. Abraço as nuvens com as ambas as mãos até as sentir coladas à pele.    Respiro por entre cada um dos seus poros e os seus olhos de água transpiram um prazer húmido com as olheiras que me sorriem até ao amanhecer
. A mulher das castanhas, a fazedora de nuvens que sobem cada vez mais alto na madrugada , esquecida de mim , lá vai ateando as brasas das cinzas esfriadas na noite passada. -Quentinhas...
Desço degrau a degrau os socalcos das nuvens que a permanência do tempo esfarrapou e envolta nas nuvens densas de fumo que se erguem ao meu lado carregadas de aroma a castanhas novas acabadas de estalar ao calor das brasas, desço a escadaria para voltar a pisar os vincos e as rugas da calçada da cidade . Longe, o som da voz da fazedora de nuvens, continua: -Quentinhas.

(De mim...)

Rochedo





Jovial , como um dia acabado de nascer..
Algures uma melodia matinal,
acordes de um cântico interior
caminhando leve, transportado pelos ares 
numa cadência languida de um sorriso gasto.....

Quando a encosta da alma se escarpa
e a vegetação do sentir escaseia.
o rochedo ergue-se nu...
quão vulnerável às intemperies do tempo
quão fràgil ao rendilhado das lagrimas...

Solitário é  o caminho....
A curiosidade debate-se  ferozmente 
no cansaço assumido ao olhar numa imensa lassidão
com a didignidade e solenidade de um poema
que se escuta por entre as fibras da suadade.

O dia fragmentado de incerteazas...
abreviado artificialmente nas gotas de orvalho 
deslizando por entre os dedos crispados de dor
manten-se  erecto , nu  como se continuasse
eternamente a contemplar a solidão...


(de mim)

em silencio...




Breve o Instante de um momento



 Foto: Breve o instante...
o momento do poema!
Este,  que contido no peito
 se solta em versos quebrados .
Um só momento....
O instante breve  da leitura
das mãos que escrevem...com emoção,  
 a ternura de um sentimento sem sentido....

Apago as cores do ar.
 É a cor do vento que me traz
 novas deste gostar  ainda menino....
Tão confuso,... tão estranho...
que me interrogo se sonho,
ou  se  é  ilusão o meu gostar....
 E porque os há de muitas formas,
 e tantas cores ....
 para lhe sentir a forma,
apago as cores da minha forma de amar...


( de mim)




Breve o instante...
o momento do poema!
Este, que contido no peito
se solta em versos quebrados .
Um só momento....
O instante breve da leitura
das mãos que escrevem...com emoção,
a ternura de um sentimento sem sentido....

Apago as cores do ar.
É a cor do vento que me traz
novas deste gostar ainda menino....
Tão confuso,... tão estranho...
que me interrogo se sonho,
ou se é ilusão o meu gostar....
E porque os há de muitas formas,
e tantas cores ....
para lhe sentir a forma,
apago as cores da minha forma de amar...


( de mim)

Quase me apeteceu escrever










Quase me apeteceu escrever....

Compreendi então...
quão cerrado o mundo esquecido de mim
quão tamanhas as margens do meu rio
quão pequenos , carregados e frios
os dias desfeitos num soluço fundo

Compreendi então...
quão limpido e louco o relógio da memõria
que a compasso do vento da alma
marca os segundos da viagem
num sussuro de saudade.

Compreendi então...
o mistério do movimento perpétuo do sentir
que em forma de manha de nevoeiro
se dissipa da palma da razão 
no desejo encerrado de uma  mão de amor.



(de mim num anoitecer de verão)

Quando a saudade desce a escada







Quando a saudade desce as escadas.....


Quando a saudade desce as escadas,
há sempre um fogo surdo lá no fundo
e um abraço de espuma tão fria....

Quando a saudade desce as escadas,
a noite trepa a escarpa indecifrável
das cinzas que pintam de negro o dia.

Quando a saudade desce as escadas,
escrevo,....rescrevo, demoro na lentidão
do sentir embrutecido no fundo das mãos.

Quando a saudade desce as escadas
a ideia de paraíso á e cicatriz do desespero
e o poema que se eleva é apenas mais  um capítulo

Enceram-se-me os olhos. solta-se-e um suspiro...
e quando a saudade desce a escadas
afogo-me no seu mar imenso , infinito...


Choro 
Não sei fazer mais nada
quando a saudade desce as escadas!



A Morte









A Morte....

Pela porta entreaberta 
entraste silenciosa
E deslizando sobre a penumbra chegaste perto...

Estendeste os braços 
como quem quer dar colo
mas nem sequer com as mãos tocaste.

Fiz-.te frente com olhar
na distancia que nos separava...
Inquieto, indignado , surpreso,
triste talvez, o meu olhar 
ou tão somente vencido..
...nem sei!!.

E tu, 
rodopiando sob o teu manto negro que vi branco, 
saíste cabisbaixa por onde entraste.....
Ate quando?...


(de mim....numa noite comprida )